domingo, 20 de março de 2011

De novo, o predador e dentes...


É curioso como certos conteúdos do inconsciente nos perseguem. Os sonhos que falam da perda de dentes continuam repercutindo nos e-mails que recebo. Depois de tanto tempo sem postar nada no blog - trocentas coisas aconteceram, tiraram meu tempo, atrasaram certas providências... mas não tiraram meu foco - escolhi um dos e-mails que chegaram. E escolhi esse porque se juntam duas coisas: dentes e predador. Claro que tudo o que respondo nada tem de conclusivo, até porque não sei quem escreve e poucos são os e-mails que contam um pouco do sonhador. Neste que coloco a seguir, pelo menos a sonhadora me conta a idade e um pequeno histórico. Embora as experiências sejam irrepassáveis, os símbolos se repetem nos sonhos e se clarificam segundo as circunstâncias que vivemos. Por isso, outros leitores poderão se ver nessas linhas. Aí vai o sonho da jovem desconhecida.

Vi o seu blog e achei seus textos completamente plausíveis e razoáveis, por isso estou recorrendo a sua ajuda. Tenho 19 anos, namoro há dois anos e meio, meus pais são separados, mas lido bem com isso. Tenho uma irmã menor. Faço faculdade e sou bastante atarefada, bem sucedida nas notas. Enfim, ontem à enoite tive um sonho.vou tentar contar o máximo de detalhes que me lembrar:

O sonho começava em um táxi, porém o taxista parecia embriagado e ele de alguma forma dirigia o táxi do banco de trás. Em algum momento ele passa a mão na minha perna em uma tentativa frustrada de algum envolvimento comigo. Isso me assustava muito, me deixou com muito medo e eu falava pra ele só dirigir rápido pra me levar ao meu destino (a casa de meu namorado, era madrugada). Depois o carro dele quebra e nós dois ficamos competindo por um novo táxi numa rua escura. A próxima parte do sonho eu estava no banheiro da casa do meu namorado (ESTA FOI A PARTE QUE ME DEIXOU MAIS ENCUCADA) e vejo que para o lado de fora de minha boca se forma uma espécie de gengiva roxa que dentro carregava um dente (daqueles que substituíriam algum outro que viria a cair), essa parte roxa se solta de minha boca, e inúmeros dentes começam a cair, o primeiro que caiu me deu uma sensação boa, mas quando os outros começaram a cair eu fico desesperada. Nisso eu ligo ao meu namorado e conto aquilo. Porém os dentes da frente permanecem intactos, se eu desse um sorriso não daria para reparar a perda dos inúmeros dentes da parte traseira da boca. Depois disso eu estou em um campeonato de um esporte que não existe, que eu jogo e meu namorado também (e eu sou péssima no esporte. Ao fim do jogo vejo ele e uma conhecida rindo e conversando e eu o questiono sobre isso, e ele não responde e fica na defensiva, o que me deixa puta e fazendo birra.



Olá, sonhadora!

Seria tão bom se eu soubesse o que dizem os sonhos! Não sabemos... os sonhos apenas nos dão pistas e a primeira delas é inserir os sonhos na nossa realidade de vida, no nosso momento presente, porque os sonhos nos falam de conflitos que estamos vivendo, ainda que não conscientemente. E esse talvez seja o maior problema para o sonhador identificar: QUAL É O CONFLITO, pois aparentemente sempre estamos dando conta das nossas vidas. E estamos. Mas de que jeito? Quais são nossas expectativas em relação às nossas relações (namorado, irmãos, pais, professores, amigos) e o que, sobre elas, a gente ainda não se questionou?
Você está com 19 anos, acabou de passar a maioridade legal, e está caminhando para maioridade emocional e biológica, que acontece aos 21 anos. Claro que a emocional não é uma coisa assim matemática... tanta gente que já passou dos 40, 50 anos e continua imatura emocionalmente.
Mas considerando seus 19 anos, a faculdade e o namoro de dois anos, certamente você está vivendo um momento atribulado de vida. Seja por aquela maioridade que mencionei, seja porque a faculdade nos coloca com um outro norte pela frente. A profissão (ou a formação que nos leva a ela) levanta muitos questionamentos. Desde fazer uma especialização na área escolhida, o que por si só dá margem a muitas ampliações, até os conflitos que experimentamos ao querer (e precisar) combinar estudo/profissão/casamento.
Nesses momentos de grandes escolhas, quando temos que deixar nossa fase "adolescente" (que, em termos, só termina aos 21 anos) para assumir compromissos (com a carreira, com as notas, com as perspectivas) é muito comum os sonhos com predadores, como você deve ter visto no meu blog. São mudanças importantes de estágio de vida e elas mexem com nosso predador interno, aquelas forças contrárias e inconscientes que nos sabotam. Tipo aquelas perguntas que fatalmente nos fazemos: será que estou no caminho certo? vou conseguir fazer uma pós? vou me casar? se eu sair de casa (para estudar, para casar, para viajar pra fora do país) quem ficará com minha mãe, minha irmã.... Sonhadora, estou só imaginando o que podem ser seus questionamentos, pois é você poderá fazê-los com assertividade. Portanto, o predador (o taxista aproveitador) se manifesta, nos aborda no escuro (é madrugada no seu sonho, é o inconsciente, o lugar que não enxergamos) e atrasa nosso caminhar (o táxi quebra e é preciso encontrar outro).
Lutamos constantemente contra nossos predadores (mesmo ele não conseguindo seguir adiante com o táxi, veja que ele disputa com você um outro táxi), sejam eles internos, sejam eles externos. Quando os identificamos, fica mais fácil lidar com eles. Quando não, eles podem perturbar nossa vida e via de regra o fazem. Nos processos de auto sabotagem em que nos colocamos ao longo da vida, certamente tem um predador atuando.
E se você vive esse momento, com tudo isso que alinhavei acima, é natural também o sonho com os dentes caindo, mostrando uma estrutura "abalada", a falta de firmeza, a consciência de que estar na vida é tomar parte de um grande jogo (o tal campeonato de um esporte que não existe... ele só existe dentro de nós e cobra nosso esforço, reflexos, empenho), a insegurança quando ao nosso poder como mulher (ficar puta porque o namorado conversa com outra mulher), o momento de perder a dentição (fazendo uma analogia com os dentes de leite, deixar de ser criança, nascer como mulher, desabrochar) para nascer a dentição permanente. Ou seja, amadurecer, ficar "mais velha", mudar de estágio, psicológico, físico, social. E nesse contexto, claro que entrará no jogo invisível ou que não existe concretamente. Não existe porque não enxergamos o jogo da disputa que se estabelece desde que entramos na vida. E precisamos nos esforçar muito, precisamos ser atletas para dar conta de tanta solicitação, para nos sustentarmos e nos equilibramos em meio a essas marés que por vezes nos levam no sentido contrário.
Não sei se respondi um pouco à sua inquietação, mas é o que é possível sem conhecer você e sem estarmos frente a frente para ampliarmos melhor seus conteúdos simbólicos.
Abraço.
Vera

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